domingo, 22 de abril de 2012

Geografia, Livro III, de Estrabão

Livro III, Geografia, Estrabão
Esta obra constitui o grande repositório da geografia helenística dos séculos anteriores. Estrabão vai, baseando-se em diversas fontes e autores, descrever o mundo conhecido de uma perspetiva geográfico-cultural.
Estrabão escreve em plena expansão do império romano, na altura da romanização da Península Ibérica. O império romano do Ocidente durou até ao séc. V a.C. e o do Oriente até ao séc. XV.
É um texto fundamental porque chegou até aos nossos dias na íntegra, dada a forma de reprodução (cópias de outras cópias) e contém um conjunto de referências a diversas obras e autores, os/as quais só conhecemos através desta obra.
A obra fala da apologia da construção do império e da relação dos povos com Roma.
Estrabão nunca esteve na Península Ibérica. A Península Ibérica marcava o fim do mediterrâneo [“o nosso mar”] e início do Atlântico (que ao contrário do mediterrâneo tem marés). A navegação no mediterrâneo não necessitava de coordenadas porque se baseava em pontos cartográficos (principalmente, em portos).
Numa dimensão mais física (Geografia Física) surgem dois temas: os mares e a sua interação com os astros e o que acontece ao sol quando se põe no mar.
Dimensão prática: Este livro não se limita a instruir e divertir, serve como guia, manual para uso de uma elite (que vai uma função no império romano). O público-alvo da obra não pode ser constituído por leitores iletrados, que não percebam a conceção geográfica apresentada.
Há um esforça sistemático para construir um sistema articulado e integrado de territórios por parte do Império Romano e isso necessita de um reconhecimento geográfico (desenho de um mapa mundo), até porque existe um objetivo fiscal. A descrição da geomorfologia ajuda a conhecer o terreno, permitindo conceber melhores estratégias de abordagem territorial.
A obra de Estrabão contém a descrição geral do território e apontamentos relacionados com os recursos.
Apresenta uma diversidade de realidades existentes na Península Ibérica.
Na cultura grega, a organização da Pólis é contrária à das sociedades étnicas. Nasce-se na Pólis, não se torna membro da Pólis.
A Pólis são cidades implantadas na planície junto ao mar, com um comércio estruturado e organizado (existe moeda). A Pólis é vista como o mundo civilizado, com comércio e moeda.
Antes da conquista romana, a Península Ibérica:
- Detinha uma diversidade de línguas e etnias;
- Complexidade de signários, inspirados em dois alfabetos (grego e fenício).
Erros de Estrabão:
- Separação norte-sul da cordilheira dos Pirenéus;
- Ponto mais ocidental como o cabo de São Vicente.
Um país que tenha condições naturais favoráveis tende para a paz e, por isso, torna-se propício o desenvolvimento da civilização e da cultura.
Dicotomia entre o selvagem que vai à árvore buscar a bolota para fazer o pão e não cultiva o cereal.
Fronteira entre o mundo mediterrânio, com o pão de cereais (implica semear e colher), vinho (implica plantar uvas e fazer o vinho, para além de ser importante e a principal bebida, dado a inexistência de um sistema de controlo da água – água era um veneno), o azeite (gordura vegetal) que são alimentos com valor acrescentado e o mundo dos montanheses, com o pão de bolota, a água e a manteiga.
Montanheses do extremo norte da Península Ibérica (Galaicos, ástures e cântabros):
- Alimentam-se de cabras (parte componente de proteína animal na alimentação);
- Pão de bolota, em vez de cereais (recoleção silvestre, em vez de agricultura);
- Cerveja em vez de vinho (esta fermentada à base de cereais);
- Gorduras animais em vez de vegetais (azeite).

Quanto mais longe do mediterrâneo, mais longe do patamar de civilização.
- Têm chefes guerreiros galaicos (Lezenho);
- Têm um habitat de altura, fortificado e com um sistema de organização interna caótico (produção individual, construção de casas sem olhar a onde e como).
Conquista e submissão do território pelos romanos:
- Aldeias convertem-se em Cidades;
- Baixar do alto dos montes para as planícies;
- Colocação de colonos (que são agentes de transformação cultural);
Os indígenas civilizados chamam-se togados.
Togado porque usa toga (o atributo físico do cidadão romano – vestuário). Isto implica integração numa nova ordem jurídica e tem importância simbólica (símbolo da identidade romana).
Os romanos ao conquistarem outros povos caracterizados como selvagens por habitarem precisamente essas zonas quase inóspitas, de relevos demasiadamente acentuados para albergar uma civilização, ensinaram-lhes formas de governação adequadas. Por conseguinte, o contacto entre estes povos conquistados e o seu conquistador proporcionou uma comunicação que permitiu transmitir conhecimento para que pudessem viver prosperamente e em sociedade, apesar das condições adversas naturais.
Conceito de cidade no mundo grego:
- Tem locais administrativos;
- Ginásio;
- Teatro;
- Praça pública;
- Condução de água alimentando uma fonte;
- “Tem delegados que vão à assembleia federal da Fócia (…) ”;
- Território delimitado;
- Organização política.
Conjunto de pessoas com organização política que gerem um território delimitado.
Para forjar uma cidade onde não existia basta organizar os indivíduos a nível político e delimitar o território. Para as converter em aldeias é fazer o contrário.
As sociedades humanas são classificadas segundo esquema tripartido:
- Agróikos (selvagens): comunidades que vivem em cavernas nas montanhas;
- Mesagróikos (semi-selvagens): comunidades que vivem em povoados nas encostas e que conhecem a agricultura e a pecuária;
- Politikós (civilizados): comunidades que vivem nas planuras, junto às orlas litorais, ilhas e rios navegáveis, praticando o comércio e com uma organização política.
Colónias: Implantação de um espaço que segue a organização da Pólis. Os colonos são frequentemente ex-guerreiros.
Roma pacificadora e geradora de civilização:
- Desenho de novos territórios (cidades nas planícies);
- Uma ‘domesticação’ do espaço – urbanização com sistema de arruamentos.
Livro III
®      Ponto de situação sobre ciência helenística: configuração do território, marés;
®      Matrizes culturais do pensamento helenístico quanto às sociedades;
®      Entendimento das raízes remotas do povoamento no espaço da Península Ibérica;
®      Mundo rural resulta da construção helenística, tendo este características distintas do mundo urbano;
®      Cidades como focos de poder, organização e estruturação dos territórios;
®      O inventário da diferença: um mundo indígena/”bárbaro” e de estranha gente com estranhos costumes.
®      Descrição das características geográficas e geológicas da Península Ibérica;
®      Faz uma descrição etnográfica (das relações);
®      Diz-se que o Tejo abunda em peixe e está cheio de ostras.
®      Conceito de etnia [“etnia é pertencer”] (pertence-se a uma etnia, porque se nasce dentro dela), que se opõe ao de cidade (pertence-se por aculturação).
Fontes por ele consultadas – autores como Posidónio, Políbio, Artemidoro, Píteas e Eratóstenes.
Encontram-se referências a heróis mitológicos como Hercules, Ulisses e Eneias.
Comércio junto à costa: pesca e salga de peixe.
Mesmo a pertinência da sua obra, como indica o próprio, advém das conquistas romanas e dos benefícios que os romanos trouxeram aos povos subjugados, que de selvagens passaram a civilizados. A figura de Augusto e mesmo o próprio Império Romano foram idealizados e são ainda vistos como personificação de uma época próspera, de paz entre as mais diversas regiões que estavam sujeitas a Roma.

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